quinta-feira, 24 de novembro de 2011

O fardo tá pesado

Meu Deus, como é difícil.
Quando eu pensava que os sentimentos estavam administrados.... aí é que eu me engano.
Eu sabia que a chegada do final do ano traria a tona as minhas emoções, só que eu não pensava que seria pra tanto. Num momento em que meu psicólogo já estava até planejando minha alta, regrido e preciso cada vez mais de apoio emocional e espiritual.
Está insuportável viver. Parece que o mundo está desabando na minha cabeça e eu não consigo fazer nada pra mudar. Não posso perder o controle, mas está cada dia mais difícil conseguir mantê-lo.
Vivo atormentada pelas imagens tristes do que vivi. Borbulham sobre meus pensamentos a cena em que recebemos a notícia que ele não tinha sobrevivido, do nada vejo ele dentro do caixão, ouço os apitos dos equipamentos que ficavam presos a ele lá na Neo, sinto o cheirinho do sabonete que usaram pra limpar ele e morro de saudade. Estou caminhando na rua e de repente lembro da hora que tiveram que fechar o caixão, quando estou andando de carro, de repente me vejo como se estivesse seguindo o cortejo fúnebre, quando vejo uma caminhonete preta então... parece que ele está lá dentro.
É horrível, não agüento mais. Estou sendo perseguida por pensamentos e lembranças que eu gostaria de esquecer. Não sei mais o que fazer e não quero prejudicar e atrapalhar as pessoas ao meu redor.
Me sinto pressionada a fingir uma felicidade que não existe. Tenho que mostrar que estou bem pra que as pessoas “pensem” que eu estou bem, em contrapartida, sou cobrada por isso.
Estou cansada... cansada de ouvir que tenho que ser forte, que Deus tem um plano maravilhoso pra mim, que isso vai passar.... Vai passar quando???? Não passou um dia sequer sem que eu pensasse em tudo o que aconteceu, sem que eu lamentasse “porque teve que ser assim?” ou “o que eu fiz pra merecer isso?”.
Não bastasse isso, tenho que ouvir comentários sem noção de pessoas sem noção que ficam esfregando na minha “eu tenho, você não te-em”.  Chega... não agüento mais.
A dor da saudade é insuportável. Uma saudade que eu nem sei do que, porque não tive tempo de viver momentos de felicidade com ele ao meu lado. Só tenho lembranças tristes de tudo e isso está me corroendo.
Ver casais com bebês sempre me faz pensar “podíamos ser nós”, ver mulheres grávidas me faz pensar “poxa, eu podia estar ganhando outro filho”... é... se a segunda gestação tivesse dado certo, eu já estaria ganhando o bebê. Mas cá estou eu, sem filho, sem barrigão, sem planos, sem expectativa.
Não tenho inveja de ninguém, graças a Deus esse é um sentimento que não tenho. Apenas lamento que eu também podia estar em mesma situação se não tivesse acontecido tudo isso.
Semana que vem o João Pedro faria 1 ano. Meu Deus, um ano já, e eu não tenho uma festinha de aniversário pra organizar, não tenho que distribuir convites, ver fotógrafo, decoração, comes e bebes.
Não tenho outro filho aqui na minha barriga pra escolher nome, esperar por ele ansiosa, decorar o quartinho, fazer chá de bebê , comprar roupinhas.
Não tenho.... eu não tenho nada do que planejei e desejei e ainda por cima tenho que viver esse tormento, esse vulcão de lembranças que surgem na minha cabeça e que estão me enlouquecendo.
Cheguei até aqui e quando olho pra trás vejo que até consegui passar o ano muito que bem, só que agora, nesta última semana, parece que o sofrimento de um ano inteiro está acumulado dentro do meu coração.
Logo chega Natal, e eu tenho mais uma vez que passar sem um filho nos braços. Isso dói, dói de mais.
Não sei se eu devia escrever isso tudo aqui... hoje não estou em um dia muito bom. Queria, dormir e acordar só ano que vem, queria sumir do mundo, queria morrer...
Mesmo tendo recebido aquele recado maravilhoso semana passada, nem isso está me fazendo conseguir suportar.
Ele, eu sei que está bem, que está feliz onde está, pois ele mesmo mandou avisar isso, mas eu, ahhh eu não sei mais nada sobre mim....

quinta-feira, 17 de novembro de 2011

Um dia especial

O fim do ano está se aproximando, e com ele as lembranças do final do ano passado vêm a toda na minha cabeça. Desde o dia 19/10 deste ano, todos os dias eu penso: “bah, hoje faz um ano de tal coisa”, ou “há um ano tudo era diferente”.

Sinceramente não gosto muito de ficar relembrando esse um ano de momentos tristes, mas infelizmente essas lembranças brotam na minha cabeça..

Porém em meio a toda a tristeza que passamos desde que descobrimos a HDC do João Pedro, ainda assim aconteceram coisas boas: eu conheci o centro espiritual Boa Nova e passei a freqüentar assiduamente (pelo amor ou pela dor, é assim sempre...), neste período conheci também pessoas que se empenharam em nos ajudar, como o Dr Lionel, cirurgião que faria a operação do JP. Mas dentre essas poucas coisas boas que conquistei nesse período, há uma muito especial, uma coisa que considero um grande presente.

Hoje, dia 17/11/11 faz um ano que conheci a Débie. Já falei dela várias vezes tanto neste, quanto no blog do João Pedro, mas o dia em que nos conhecemos é um dia que merece ser relembrado.

A Débie é mãe da Cecília, que também teve HDC, mas graças a Deus conseguiu superar as dificuldades e hoje vive muito bem. Nesta época ano passado, a C como é carinhosamente chamada, estava na UTI no Moinhos se recuperando e eu e meu marido estávamos começando a nossa luta.

Quando fomos conhecer a UTI do hospital, a Dra Desiré e a Enfa Andréia conversaram muito com a gente e depois nos apresentaram a Débie e o Rafa. Nooooossa, poder conversar com alguém que já havia passado por situação igual foi tão confortante, nos deu tanta confiança de que tudo daria certo.

Conversamos tanto, descobrimos tantas afinidades, tantas coisas em comum que não queríamos mais ir embora, tanta era a minha vontade de ficar perto deles. Mas quando nos despedimos, comentei com o Amaral “eles são bem como a gente, arranjamos amigos na serra agora”. Mais tarde fui saber que a Débie disse o mesmo ao Rafa.

Daquele dia em diante, a Débie passou a ser assunto diário, falava pra todo mundo sobre ela e sobre a C.

Nunca imaginamos que nos veríamos tão depressa.... dia 02/12, quando o João Pedro nasceu, a C ainda estava no hospital, porém já no quarto e casualmente o Amaral e o Rafa se encontraram nos corredores do hospital.

No dia seguinte, a Débie foi me ver no quarto, mas infelizmente quando ele chegou as notícias já não eram boas. Tudo de pior já tinha acontecido. Lembro da cara de espanto dela quando me perguntou “se o meninão já havia chegado” e eu respondi “ chegou e já se foi”... Nossa, o abraço que ela me deu foi tão forte, tão amigo que senti naquele momento que de verdade tinha ganhado uma amiga. Ali foi mais um dos momentos em que a Débie foi muito especial pra mim.

Estava só com minha mãe e minha irmã no quarto aguardando a liberação da papelada e a Débie foi uma companhia especial: ficou com a gente um bom tempo e por alguns momentos me fez distrair a cabeça de tudo que estava acontecendo.

Mais uma vez nos despedimos e achei que aquela seria a última vez que a veria. Porém segui acompanhando a evolução da C pelo Orkut. Via as fotinhos, de vez em quando mandava um recado e a Débie sempre me respondia.

Fomos ficando mais próximas, mesmo que virtualmente, até que mais uma vez a Débie foi fundamental na minha vida: ela me mandou um e-mail falando que havia feito um blog para contar a história da C.

Naquele dia vi que tínhamos mais alguma coisa em comum. Pensei que assim como foi importante pra mim, ter alguém pra conversar sobre HDC, que isso seria importante pra outros pais. Mesmo que a história do JP não tenha tido o mesmo final que a da C, mas que seria importante falar da luta dele e mostrar que é possível, por mais difícil que seja.

Então, motivada pela Débie, criei o blog do João Pedro e através do blog, iniciei uma luta pra auxiliar mamães que tenham a infelicidade de passar por tudo isso.

E desde então, eu e a Débie nunca mais deixamos de manter contato. Nos falamos praticamente todos os dias e a presença dela da minha vida é tão forte que até minhas amigas me perguntam dela de vez em quando.

Este ano, no dia dos pais, eu e minha família fizemos um passeio que passava pela cidade dela, e fiquei muito contente quando ela, o Rafa e a C foram ao nosso encontro. Quando nos vimos, parecíamos amigas de infância matando a saudade.

Durante este ano, descobrimos tantas coisas em comum, tantos gostos e desgostos iguais, que me atrevo até a dizer que somos mais do que amigas, que somos irmãs de coração, unidas por um mesmo laço.

Enfim.... sem me prolongar de mais.... queria escrever um post especial pro dia de hoje, pois quero que fique registrada a minha alegria em ter conquistado mais uma amiga.

Débie, amiga querida...
Quero te agradecer por tudo que tu fez e faz por mim. Tu não tens idéia do quão especial tu és pra mim. Naquele dia 17/11/2010, Deus cruzou os nossos caminhos com certeza por algum objetivo muito especial. Como tu mesma falou pra mim “Deus escreve certo por linhas tortas”. No nosso caso, com certeza, pelas linhas mais tortas possíveis.... quem imaginaria fazer amizade em uma UTI Neonatal???

E complementando a tua frase, eu reforço dizendo que “nada é por acaso”. Hoje somos amigas, unidas por uma mesma causa: ajudar mamães a enfrentar o dilema da HDC. E te digo com conhecimento de causa, que tu faz esse papel perfeitamente.

Bom, se deixar por mim, fico escrevendo até amanhã.... Enfim.... deixo aqui uma mensagem, escrita por Merlyn Monroe...

“Algumas vezes na vida, você encontra uma amiga especial. Alguém que muda sua vida simplesmente por estar nela. Alguém que te faz rir até você não poder mais parar. Alguém que faz você acreditar que realmente tem algo bom no mundo. Alguém que te convence que lá tem uma porta destrancada só esperando você abri-la. Isso é uma amizade pra sempre. Quando você está pra baixo e o mundo parece escuro e vazio, sua amiga pra sempre te põe pra cima e faz com que o mundo escuro e vazio fique bem claro. Sua amiga pra sempre te ajuda nas horas difíceis, tristes e confusas. Se você se virar e começar a caminhar, sua amiga pra sempre te segue. Se você perder seu caminho, ela te guia e te põe no caminho certo. Sua amiga pra sempre segura sua mão e diz que vai ficar tudo bem. Sua amiga é pra sempre, e pra sempre não tem fim.”

sábado, 12 de novembro de 2011

11/11/11 - O dia do abraço


Ah algum (bastante) tempo eu comecei a perceber a que a seqüência de números 1, de certa forma me perseguia.

Quando eu fazia academia (por isso que eu disse que foi ah bastante tempo), e estava na esteira, eu olhava pra ver quanto tempo ainda faltava pra acabar aquele martírio e seguidamente (sempre) o marcador indicava 1min11seg (1:11). Comecei a achar estranho, pois era sempre a mesma coisa. Meu olhos eram atraídos naquele momento.

Tempos depois, comecei a olhar no relógio pra ver que hora era e quase sempre via quando era 1:11, ou 11:11. Isso era intrigante. Poxa, o que será que tem nessa coisa de números 1 que tá sempre atraindo meus olhos?

Depois disso, o fato de números 1 aparecem em seqüência pra mim começaram a ser mais freqüentes. Via isso em placas de carro, em números de casa, o número do ônibus, número do vagão do trem, marcador de km do carro... em tudo...

Um dia eu estava intrigada e comentei isso com minha irmã, e ela em espanto me contou que isso também acontecia com ela. Achamos engraçado e rimos muito, brincando que isso devia ser um código pra gente decifrar hehehe. Isso virou até piada entre nós. Sempre que uma via números 1 em seqüência, comentava com a outra, mas sabíamos que isso não passava de uma bobagem.

Aí engravidei, e fazendo as contas, a data do parto poderia sem em 11/1/11. Choquei... mais uma vez os números 1 estavam me perseguindo. Mas aí aconteceu tudo diferente....

Depois que aconteceu toda essa tristeza na minha vida, um belo dia me acordei com vontade de pesquisar sobre a vida de Santo Antônio (já contei isso no blog do João Pedro), e encontrei uma trezena que deveria ser feita durante 13 terças feiras. Achei que deveria iniciar essa rodada de orações e fui olhar no calendário, a próxima terça seria o dia 11/1/11. Pronto, continuei intrigada....

Logo em seguida, tive um estalo..... Estava assistindo o filme “O todo poderoso 2”, e nesse filme o número 614, fica aparecendo toda hora. No relógio,  no carro, no número da casa, em tudo.... então o ator vai até a bíblia e encontra uma citação no cap 6 versículo 14 que o manda construir uma arca para salvar a humanidade do dilúvio. Achei engraçado aquilo e pensei em pesquisar o que dizia o capítulo 1, versículo 11.

Não sei como localizar citações na bíblia, então joguei na internet e encontrei algo sobre Samuel, cap 1, ver 11 que conta a história de Ana e Peninha. Ana tinha o sonho de ter filhos e não conseguia, então Peninha a irritava porque tinha seus filhos, eis então que Ana fez um voto com Deus. Vejam o que dizia: Em 1 Samuel cap 1 ver 11 Ana fez um voto com Deus e se o senhor desse a ela uma filho ela daria seu filho por todos os dias da sua vida para servir o Senhor. fonte: (http://igrejas.noivadecristo.com.br/showestudo.asp?id=597)

Quando li isso, fiquei impressionada.... Eu queria tanto ter um filho, e quando o tive, o entreguei de volta ao Senhor.

Foram tantas coisas que me marcaram em função da seqüência de número 1 e eu e minha irmã brincávamos e ríamos pensando no que aconteceria neste ano em 11/11/11 às 11:11hs.

Pra mim não aconteceu nada de mais. Estava no trabalho em treinamento e nem vi passar. Mas com certeza esse vai ser um dia muito marcante na minha vida, e vou chamá-lo daqui pra frente de “dia do abraço”.

A noite, fui ao Boa Nova, pois fui encaminhada para um grupo que trabalha desobsessão. Em função da proximidade do final do ano e de todas as lembranças estarem pipocando na minha cabeça com muito mais freqüência, acharam que seria bom eu participar de novo deste grupo.

Chegando lá, quis sentar bem na frente, mas logo que sentei, toquei de lugar e fui me sentar num lugar mais acessível e pensei “que que alguém queira me dar uma abraço, aqui fica mais fácil”. Quando não estamos com o astral legal, os médiuns do boa gostam de abraçar, pra fazer a troca de energias.  

Iniciou a seção com orações e em seguida foi apresentado o tema da palestra da noite: Aborto! Pronto, pensei “lá vou eu morrer chorando”.... O Assunto era muito interessante, falava da percepção espírita sobre o aborto intencional, e explicava as conseqüências que o ato de decidir por um aborto pode causar nas próximas vidas: dificuldades de engravidar, perda de filhos, abortos espontâneos, filhos rebeldes entre outras coisas....

Ouvi atentamente tudo o que o palestrante dizia e comecei então a rezar em pensamento, pedindo perdão se eu cometi um ato desses em outras vidas, que se fiz isso, foi em outra ocasião e que nesta vida jamais cometeria um aborto, pois o que mais quero nessa vida é ter meus filhos e formar uma família feliz.

Estava á no meu cantinho, orando em silêncio, quando de repente uma das médiuns do grupo saiu lá de trás e veio na minha direção. Pensei que ela ia me dar um passe, mas pra minha surpresa ela parou na minha frente, abriu os braços e me disse baixinho “eu tenho um abraço pra te dar”. Levantei, abracei ela e instantaneamente comecei a chorar. Ela, sem me conhecer, muito menos conhecer a minha história, olhou nos meus olhos e começou a falar: “ele não quer que tu chore. Ele te mandou esse abraço e quer que tu saiba que ele é um menino muito feliz, mas que quando tu fica triste, ele fica triste também. Ele não quer que tu fique triste, e pede que tu tenha força”.

Nossa.... ouvir aquilo me deu uma força imensa.... Pedi à médium então que dissesse a ele que eu o amo muito e que queria muito poder ter ele de novo comigo.  E ela mês disse “ele sabe, e ele ta dizendo que também te ama e quem sabe possa voltar pra ti um dia”. Ela me abraçou forte, me deu um beijo, um passe e voltou pro fundo da sala onde seguiu seu trabalho.

Minha nossa.... como não acreditar???? Eu ganhei um abraço do meu filho no dia 11/11/11.
Entendi o recado. Não posso ficar triste. Ele não gosta de me ver triste.

Pra muitos, isso pode ser uma loucura, mas pra mim é o que move a minha vida e o que me permite viver. Eu vivo por ele, porque ele me dá forças.

Seguindo a palestra, o palestrante perguntou se sabíamos como se formava uma pérola. Ele explicou então que não é toda ostra que formam belas pérolas. Explicou que a pérola se forma através de um pequeno grão de areia que entra na ostra quando ela esta se alimentando. Esse grão de areia começa a machucar a ostra, machuca tanto que seu organismo começa a produzir um líquido como defesa. Esse líquido vai aderindo ao grão de areia e sobre o grão forma uma camada que ameniza a dor que a ostra sentia. Forma-se assim a pérola.

Achei tão legal a história, mas fiquei muito emocionada quando ele terminou com a seguinte conclusão: “só são capazes de gerar belas pérolas, as ostras que um dia se machucaram”.

Espero um dia poder formar as minhas pérolas....

Abraço a todos.

quarta-feira, 2 de novembro de 2011

Por que ir ao cemitério??? ?

Quando meus avós morreram eu tinha 8 e 9 anos e nessa fase eu não tinha opinião nem vontade própria, então sempre no dia de finados eu tinha que ir com meus pais ao cemitério pra rezar. Nunca entendi porque eu não podia rezar de casa, mas tudo bem...

Os pais do meu pai estão em um cemitério longe, mas os pais da minha mãe estão no cemitério que fica na rua da casa da minha mãe, então no início, logo que meu avô faleceu, eu acompanhava minha mãe toda semana. Íamos ao cemitério, limpávamos o túmulo, levávamos flores e muitas vezes passávamos a tarde de domingo lá. Eu achava isso um tédio, mas ia pra acompanhar.

Quando entrei na adolescência e comecei a ter minhas vontades e minha liberdade, comecei a me perguntar sobre a criação do mundo, das coisas e principalmente me perguntava pra onde íamos depois que morríamos. E comecei sozinha a tirar conclusões dos meus pensamentos, coisas que na catequese e na crisma não me ensinaram, então comecei a pensar que “enterrar” uma pessoa era a coisa mais inútil que podia existir. Passava na frente do cemitério e ficava pensando “que inutilidade, tanto espaço de terra que podia virar casas pra comunidade, e estão aí, cheia de ossos de gente morta”.

Aqueles que acharem que estou sendo grosseira, me desculpem, mas é isso que pensava na época sobre cemitérios. E hoje com o entendimento da doutrina espírita, só reforcei esse meu pensamento.

Quando recebemos a terrível notícia que tínhamos perdido o João Pedro, nem me passava pela cabeça que teria que pensar nessas coisas. Meu pai e o Amaral começaram a organizar a papelada de liberação e então tiveram que me perguntar o que eu queria fazer. Meu Deus, como eu podia pensar numa coisa dessas. Jamais pensei na vida que um dia eu perderia um filho, quem dirá que eu precisaria decidir oque fazer com o corpinho que nem pude ter no colo com vida.

Sempre fui favorável à cremação, mas diante das circunstâncias, nem pensei direito, e o mais prático e rápido era enterrar no mesmo cemitério dos meus avós (esse na rua da casa da minha mãe). 

No dia que o enterramos, (ah como eu queria nunca mais lembrar desse dia) eu lembro que quando eu estava fazendo a última despedida (pronto, não tem como não chorar quando lembro disso), eu abracei a lápide e disse: “pois é vô, fazia muito tempo que eu não vinha aqui ver vocês, mas agora eu vou vir mais vezes”.

Os dias que seguiram eu não preciso nem dizer como foram terríveis, quem já perdeu alguém que ama sabe bem como isso é horrível, e é lógico que eu não tinha vontade nenhuma de ir no cemitério e reviver tudo aquilo. O tempo foi passando e aos poucos eu fui voltando à minha consciência e meus pensamentos sobre cemitério voltaram. Afinal, o que eu ia fazer lá, se eu sentia a presença dele em todo lugar???? Não era lá, dentro daquela caixa de tijolos que eu ia sentir ele mais próximo de mim. Muito pelo contrário, sempre achei que voltando lá, eu sofreria demais, reviveria tudo aquilo que eu quero um dia deixar de lembrar.

O tempo passou e eu NUNCA voltei no cemitério. Não sei nem de que jeito está o túmulo, e nem faço questão de saber. Tenho certeza que tanto o João Pedro quanto meus avós não estão tristes por eu não ter ido lá. Se o que eu acredito realmente é possível, eles estão num lugar muito mais agradável do que um cemitério mórbido.

Outro dia estava conversando com uma amiga sobre este assunto e ela ficou espantada quando eu disse que nunca tinha ido, ela deu um salto e disse “mas já faz quase um ano”. Pois é.... quase um ano, e eu não fui e não pretendo voltar lá pra “visitar” o meu filho como algumas pessoas dizem. Pra mim é inconcebível imaginar eu entrando num cemitério pra levar flores ao meu filho. Não dá, simplesmente não dá....

Só que agora, na semana que antecedeu o dia de finados, comecei a pensar sobre isso. Será que eu não devia ir? Será que não seria importante? Não sinto vontade de ir, mas penso nas pessoas que são ligadas a nós. A família do Amaral é muito de ir no cemitério “visitar” os parentes e penso se, pela minha sogra, eu não deveria ir até lá, arrumar o túmulo, colocar umas florzinhas, deixar arrumadinho, porque pra ela, lá é onde ele está.

Não sei, sinceramente não sei. Ontem conversei com o Amaral sobre isso e ele me disse que acha que isso não é importante. Ele também não sente vontade de ir, não sei se porque acredita na mesma coisa que eu ou se é só pelo fato de não ser um lugar agradável... Pra nós, cemitério é só um lugar de lembranças tristes e dor, muita dor.

Quando eu quero lembrar do João Pedro (como se eu pudesse “escolher” quando pensar), ou seja, o tempo todo, eu penso nele com amor. Tento lembrar apenas das coisas boas que vivemos, mesmo com ele dentro da minha barriga. As coisas ruins eu não quero lembrar, e ir no cemitério, não tem escolha, só vai me fazer lembrar das coisas ruins.

Minha mãe tem na casa dele uma roseira branca que ela plantou pra ele. A roseira tá linda, cheia de botões. Essa é a forma que ela usa pra lembrar ou homenagear ele. Não sei se ela já voltou no cemitério depois que tudo aconteceu, nunca perguntei, porque esse é um assunto que eu gostaria de nunca mais ter que lidar...

Com certeza vai ter gente pra dizer que eu sou desleixada, que nunca arrumei ou levei uma florzinha pra ele. Mas eu não tô nem aí pra o que as pessoas pensam ou dizem. Eu não preciso ir num lugar de pedra levar um vaso de flores se na minha casa terá um jardim inteiro pra ele. É tudo uma questão de crença, de ponto de vista, de decisão ou até mesmo de gosto. E eu decidi: EU NÃO QUERO IR NO CEMITÉRIO.

Hoje o João Pedro estaria fazendo 11 meses, e é difícil conseguir não lembrar, na verdade é difícil todos os dias, mas em datas especiais fica mais complicado ainda. Ainda mais coincidindo com o dia de finados, que naturalmente é um dia dedicado a lembrar dos que já se foram (que coisa mais estranha, um dia pra sofrer!!!). E pra evitar que minha cabeça ficasse só pensando nisso, resolvi que ia trabalhar. Enquanto todo mundo tava curtindo um dia de folga ensolarado, eu estava no trabalho, sozinha, de cabeça baixa, rendendo 110%.

É assim, o negócio é manter a mente ocupada, mesmo que seja cansativo.

Meu filho sabe, que mesmo não indo no cemitério, eu não deixo de pensar nele um segundo e que nossos laços estão unidos pra sempre, (mesmo que vivendo em planos diferentes) o amor que nos une navega por estes dois planos e nos faz sentir muito próximos. Eu sinto isso.

Hoje, como estava sozinha, trabalhei ouvindo música e a primeira música que ouvi me tocou muito. Prestei atenção em apenas uma parte, pois depois disso fui tomada por uma emoção fortíssima, um arrepio e em seguida uma sensação de paz. Deixo aqui a letra da música em homenagem ao meu amado filho e me faço a seguinte pergunta, que na verdade já sei a resposta: é preciso ir ao cemitério pra sentir ele junto de mim???

Versos Simples
Chimarruts

Sabe, já faz tempo,
Que eu queria te falar,
Das coisas que trago no peito.
Saudade,

Já não sei se é a palavra certa para usar
Ainda lembro do seu jeito.
Não te trago ouro,

Porque ele não entra no céu,
E nenhuma riqueza deste mundo.
Não te trago flores,
Porque elas secam e caem ao chão.
"Te trago" os meus versos simples,
Mas que fiz de coração.